segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

MOVIMENTOS GREVISTAS: A Paralisação da PM na Bahia e os movimentos salariais das corporações policiais no país. Algumas Observações.

Greve, não! Face a ilegalidade, chama-se
paralisação!(retirado de paraiba.com.br)
Quando a Polícia Militar paralisa suas atividades, em qualquer estado da federação, a sensação sentida pela população é de pavor! Pavor não só pelo fato de que as ruas vão estar entregues a toda sorte de falta de fiscalização e consequente proliferação da criminalidade, mas também porque quando a PM para, todo um desencadeamento de atos violentos e de vandalismo começam a acontecer. É o histórico da corporação. Os atuais atos praticados pelos policiais militares da Bahia, em sua recente paralisação, não são novidade na crônica dos movimentos de reivindicação salarial das polícias no Brasil. Mesmo com a vedação constitucional ao direito de greve de policiais militares, resultante da equiparação da PM ao exército por se tratar de uma corporação militarizada, (e, portanto, proibida do exercício do direito de greve), nas duas últimas décadas a Polícia Militar vem parando suas atividades em protestos violentos, midiáticos, com trocas de tiros, bombas de gás, muitas prisões e um sentimento de insatisfação recorrente nas fileiras de seus policiais, reclamando dos baixos salários e das precárias condições de trabalho.


A paralisação  da PM na Bahia quase
 acaba com o Carnaval
de Salvador
(retirado exame.abril.com.br)
 A diferença da paralisação da última semana da PM baiana é que, parece que agora, o movimento de paralisação dos policiais militares provocou uma espécie de reação em cadeia, insuflando as corporações policiais de outros estados a também pararem suas atividades. É o que ocorre agora no Rio de Janeiro, está acontecendo no Rio Grande do Sul, pode vir a surgir em Alagoas e no Rio Grande do Norte e pode ser que também venha a acometer a polícia de mais outros estados. No período em que permaneceu parada a PM baiana, o governo do estado da Bahia contabilizou um aumento de mais de 100% no número de homicídios, o Carnaval quase foi ameaçado de não acontecer, e o número de frequência de visitas de turistas aos principais pontos turísticos de Salvador, como o Pelourinho, praticamente desabou. Apesar de já estar suspensa a paralisação é retomadas as negociações com o governo, na Bahia, assim como em outros estados, o clima ainda é de grande desconforto, e os policiais militares que compõem o movimento utilizam as festas carnavalescas como moeda de troca, pois sabem do caos que pode ser provocado nas grandes cidades, caso a PM deixe de trabalhar nessa época do ano.


Difícil dizer até que ponto uma luta legítima por direitos
esbarra nos limites da ética e da legalidade
(retirado de noticias.uol.com.br)
 Ocorre que, como já foi dito, por um imperativo constitucional as Polícias Militares dos estados equivalem-se às Forças Armadas e não podem entrar em greve. Apesar da proibição, desde a promulgação da Constituição de 1988 os estados federados já contabilizam mais de 300 paralisações de policiais militares até o presente ano. Como não é uma categoria profissional legalizada e habilitada a fazer greves, os policiais militares adotam formas de organização toscas, criando associações pseudorecreativas e clubes em suas fileiras, tão e simplesmente para depois valerem-se delas para insuflar paralisações. Como não estão acostumados a estabelecer movimentos de reivindicação organizados, em moldes democráticos, tais como as organizações civis, os policiais militares muitas vezes reivindicam seus direitos de forma violenta, valendo-se da truculência e do vandalismo, mesmo antes de iniciarem qualquer canal de diálogo com o governo, atemorizando a população.


No Rio de Janeiro, policiais militares também ameaçam
paralisar suas atividades
(retirado de dialogospoliticos.wordpress.com.br)
 Aí está uma das principais críticas e uma qualidade negativa das paralisações de policiais militares: a truculência. Como não estão acostumados a atuar num Estado Democrático de Direito, muitos policiais criados dentro da subcultura policial, veem o Estado como um inimigo (assim como veem os cidadãos em geral, durante sua atuação policial), numa disposição bélica que envolve atrocidades, como incendiar carros, ônibus e pneus, dar tiros de advertência para o ar, enquanto caminham em passeatas e a ocupação forçada de prédios públicos, como ocorreu com a invasão do prédio da Assembléia Legislativa, na capital baiana. Tais atitudes, de um corporativismo belicoso que enxerga o protesto e o exercício do direito de reivindicação como confronto e não como negociação, acabam por manchar mais ainda a imagem da corporação policial perante a opinião publica e transformar os líderes do movimento de mártires a criminosos. É o que está acontecendo nos recentes acontecimentos, que vieram junto com a repercussão da paralisação da PM baiana.


Marco Prisco: Este homem é o responsável por boa parte das
últimas paralisações de policiais no país.
(retirado de maierovitch.blogterra.com.br)
 Marco Prisco é um ex-bombeiro e candidato derrotado a vereador e deputado que tentou, sem sucesso, transformar a paisagem lendária  e paradisíaca da Bahia em uma praça de guerra. Agitador profissional, Prisco foi expulso da Polícia Militar da Bahia após uma panfletagem em 2001, e desde essa época, mantendo-se através de liminares na Justiça, valeu-se de um séquito de policiais militares e bombeiros que passaram a apoiá-lo, liderando associações de de policiais militares e seus familiares no estado baiano. O ex-bombeiro é um dos personagens de uma intricada rede nacional que envolve policiais candidatos a parlamentares e sindicalistas, organizadores de greves policiais em vários estados da federação e políticos oportunistas (como o deputado federal, Antony Garotinho, flagrado em interceptações telefônicas, conversando com líderes do movimento) que veem a paralisação dos policiais militares como uma oportunidade de colher dividendos políticos. Recentemente, Prisco colheu a adesão do cabo bombeiro Benevenuto Daciolo, responsável pela bem sucedida manifestação dos bombeiros do ano passado, no Rio de Janeiro. Encantado pela possibilidade de fazer eclodir uma nova manifestação salarial de sua categoria, aprendendo os métodos intimidatórios de Prisco, Daciolo foi até a Bahia solidarizar-se com os colegas baianos e acabou preso, juntamente com Marco Prisco, principal líder do movimento.

 Assim como as milícias, as organizações grevistas de policiais militares (escondidas sob o rótulo de associações) atuam à margem do Estado de Direito, confrontando não apenas a legalidade, mas a própria democracia. Lutar por melhorias salariais é direito de qualquer associação ou grupo profissional, mas desde que respeitem os limites que a lei estabelece, sob a pena de grupos armados fazerem a autotutela de seus direitos e passarem a usar civis (no caso, mulheres e crianças, filhos dos policiais paralisados) como escudo humano, na tentativa da Polícia Federal e do exército conter o movimento. Sou um fã dos movimentos sociais e minha tese de doutorado louva suas reivindicações, mas não posso concordar com manifestações meramente corporativas que ao invés de conquistar a sociedade (como foi a greve dos bombeiros  do ano passado, no Rio de Janeiro), jogam a corporação policial contra uma população que deveria, em tese, ser protegida por essa mesma corporação. Será que a aprovação de um projeto de emenda constitucional vale tudo isso?!


A paralisação da PM baiana já custou a remoção de um
general, pego aqui confraternizando
 com os policiais revoltosos.
(retirado de panoramabrasil.com.br)
 Sobre a PEC 300, algumas pequenas considerações. Repito e continuarei a repetir: considero louvável a pauta de reivindicação salarial dos policiais e bombeiros de todo o país, que, merecidamente, devem receber melhorias salariais e condições dignas de trabalho e vida, com um significativo aumento de suas condições materiais. Agora não concordo que a aprovação de um teto salarial nacional, unificado mediante subsídios do governo federal, irá solucionar os problemas da segurança pública; ou mesmo as problemáticas condições de trabalho e remuneração dos agentes que compõem as forças policiais. A PEC 300 reveste-se de uma forte carga demagógica, apoiada por setores parlamentares extremamente corporativos e que pensam em satisfazer somente seus interesses pessoais e eleitoreiros, garantindo-lhes base política nas próximas eleições (principalmente na eleição de candidatos a prefeitos que são parlamentares ou indicados por eles). O contéudo da PEC, sem uma devida (e séria) avaliação, é inaplicável, por conta da gigantesca soma financeira que teria que ser empregada de antemão, para satisfazer um contingente gigantesco de policiais, muito maior do que muitos exércitos. Assim, considero a PEC 300 de difícil aprovação, até pela disposição da atual presidente de vetar o seu texto, caso ela passe pelas duas casas do Congresso Nacional. Acredito que a solução mais viável seria o contrário, ao desregulamentar a questão das polícias do interesse da União (com exceção da Polícia Federal e da PRF) e colocar os limites salariais das polícias militares e civil no âmbito da suprema responsabilidade dos estados. Se competiria tão somente aos estados federados organizar suas políciais na forma que lhe conviria, também seria lícito que cada estado estabelecesse seus tetos salariais de remuneração, com direito à organização das corporações a também lutarem por melhores salários, com um direito de paralisação assegurado por lei.


Para mim, a solução ainda repousa na
desmilitarização do aparato policial.
(retirado de humorpolítico.com.br)
 Acredito que é pelo caminho da desmilitarização do aparato policial que seja possível promover uma grande e profunda reforma na segurança pública desse país, como também propiciar novas condições de trabalho e reivindicação de direitos para as corporações policiais. Defendo uma das saidas apoiadas pelo especialista em policiamento comunitário, Theodomiro Dias Neto, em seu livro Policiamento Comunitário e Controle sobre as Polícias (Lumen Juris, 2000), em que pode ser pensada uma política preventiva, fardada, atuando ostensivamente num policiamento de natureza civil, sem carregar consigo a herança autoritária do militarismo. No dantesco cenário visto com a paralisação da PM na Bahia, serve-nos de lição que, uma vez fardada, porém desmilitarizada, seria possível conceder o direito de greve às corporações policiais uniformizadas, garantindo-se a plena reivindicação a esses policiais, que, educados e habilitados a exercer esse direito, realizariam suas greves de forma bem diferente daquelas vistas nas últimas paralisações temerárias, e que culminaram no cenário de pavor e insegurança que permeou os recentes acontecimentos no solo baiano.

Acho que, como trabalhadores, os policiais militares tem todo o direito de reivindicar melhores salários para sustentar a si próprios e suas famílias; mas também creio que o processo de lutas por aumentos salariais e mais proveitosas condições de trabalho, parte pela iniciativa de atuações pacíficas, educativas, aglutinadoras e não violentas, como foi o caso dos Bombeiros no Rio de Janeiro, no ano de 2011, com manifestantes vestidos de palhaços, do que policiais revoltados virarem pistoleiros, à luz do dia, querendo fechar ruas, provocar pânico e tumulto nas estradas, destruindo carros e caminhões. Aí já é demais. Barbárie não se confunde com revolução!!