sábado, 2 de março de 2013

CRIME E EVENTOS ESPORTIVOS: A Fiel pode reclamar, mas, desta vez, a torcida corintiana errou feio.

Kevin Espada:uma morte absurda.
Quando eu era criança, com meus 7 anos de idade, morando em Belém do Pará, eu gostava de, nas primeiras horas da tarde, sair pela rua procurando tampinhas de refrigerante que tivessem fotos dos jogadores dos campeonatos nacionais de futebol ou dos que jogaram na última Copa do Mundo. Eu fazia coleção dessas tampinhas, porque o que me interessava eram as fotos, montando um álbum de figurinhas que todos os garotos dessa idade tem o costume de montar. Lembrei disso há poucos dias, quando caminhava por uma das calçadas das ruas da Zona Norte da cidade de Natal, e vi algumas tampinhas de garrafa espalhadas pelo chão. A emoção saudosista de um momento tão pueril e singelo da minha vida, relacionado com o futebol, fez-me recordar outro episódio, recente, e que, ao invés de alegria, deu lugar à revolta: a morte de um torcedor adolescente, boliviano, em um dos jogos do torneio Libertadores da América, em que jogava o Corintians contra o San Jose, da Bolívia, por conta do disparo fatal de um sinalizador dentro do estádio Jesús Bermúdez, pelos fanáticos integrantes da torcida corintiana, na estreia do time paulista no célebre torneio latino-americano deste ano.

O Corintians, como se sabe, foi campeão mundial interclubes há menos de três meses, derrotando o favorito Chelsea. Na ocasião, elogiei nas redes sociais a conquista do clube, apesar de não ser corintiano. Meses antes, no ano passado, quando o Corintians ganhou a Libertadores de 2012, pela primeira vez em sua história, escrevi extenso artigo em meu outro blog, o www.conexoesinevitaveis.blogspot.com , elogiando o feito corintiano, em postagem que pode ser encontrada no arquivo de textos publicados. Pena que tão pouco depois de um ano mágico de tantas conquistas, o "Timão" tenha sofrido um violento revés e uma penalização quase unânime da opinião pública, por causa do comportamento de seus torcedores. É realmente lamentável que rapazes jovens, muitos deles da periferia paulistana, tenham ingressado num ônibus fretado pelo Clube, em direção a Cochabamba, na Bolívia, não apenas para torcer pelo seu time, mas também para defenestrar e até mesmo matar integrantes da torcidade adversária.

Na Bolívia, a revolta dos familiares de Kevin.
O jovem Kevin Douglas Beltrán Espada tinha apenas 14 anos, quando um sinalizador marítimo acionado e disparado por um grupo de torcedores do Corintians acabou por ceifar sua vida, atingindo-o mortalmente no olho, atravessando seu crânio e matando-o quase que imediatamente. Ao final do jogo foram detidos pela polícia 11 torcedores, que agora, presos preventivamente, respondem a processo penal na Justiça boliviana. Nos últimos dias foi apresentado, já no Brasil, um jovem de 17 anos que teria assumido o disparo (em sua versão, acidental) do artefato explosivo que causou a morte de Kevin. Entretanto, pelas imagens do video do jogo, em que é filmada a torcida corintiana no examo momento em que o sinalizador é disparado, resta pouca dúvida de que mais pessoas estavam envolvidas no disparo de um artefato que é proibido nas competições esportivas autorizadas pela CONMENBOL (a Confederação Sul-:Americana de Futebol que organiza o torneio da Libertadores). Por conta da presença desse tipo de aparato dentro de uma partida oficial do torneio, o Corintians foi penalizado administrativamente por meio de uma medida cautelar, que impede sua equipe de jogar os próximos 60 dias do campeonato com a presença de torcida. Isso implica em dizer que, nos próximos jogos, o time corintiano terá que jogar com portões fechados, para não permitir a entrada de sua torcida, causando um prejuízo de milhões em ingressos que terão que ser reembolsados aos seus compradores.

Considero justa a medida punitiva aplicada pelo CONMEBOL diante de um caso tão sério. Afinal, a vida humana não tem preço e não pode ser contabilizada no valor de ingressos. O clube paulista alega que o erro foi da organização do estádio, ou das autoridades bolivianas, que não revistaram devidamente centenas de torcedores que foram assistir o jogo do Timão na Bolívia, para encontrar com eles armas ou artefatos explosivos. Ledo engano! Um clube deve se responsabilizar pelo comportamento de sua torcida. Afinal, o que seria de um time sem sua torcida? São milhares de torcedores que, em todo o mundo, lotam estádios, aquecem o mercado e animam patrocinadores, indo de carro, ônibus, avião ou até mesmo a pé para assistir o seu time jogar. Nesse sentido, quando são formadas torcidas organizadas e estas são patrocinadas pelos clubes para ir aos estádios assistir os jogos de seus times, compete ao próprio clube verificar se seus torcedores não vão dar o vexame de chegar nesses locais com armas ou com algum objeto proibido. É assim que se faz nos países desenvolvidos e é assim que se devia fazer com o Timão, assim como todos os outros times.

O caso envolvendo os torcedores corintianos é de homicídio doloso, por meio de dolo eventual, quando o autor do delito não quis necessariamente que o crime acontecesse, não tinha a intenção de cometer o mal, mas assumiu o risco de produzí-lo. Quando um grupo de torcedores sabe que usar artefatos explosivos é proibido nos estádios, e mesmo assim leva esse tipo de produto para um ambiente fechado, lotado de pessoas que podem ser atingidas (e até mesmo mortas) por esses artefatos, está mais do que provado de que os que assim agiram adotaram um comportamento de assumir o risco de suas ações. Nesse sentido, devem ser julgados não por imprudência ou negligência, em casos típicos de crimes culposos, mas sim em crimes onde prevalece o dolo (a vontade consciente), em que a pena é bem maior. Além da pena alta, os acusados da morte do menino Kevin podem ter a pena aumentada mais ainda, pela acusação de homicídio qualificado, se fosse levada em conta a legislação penal brasileira, uma vez que cometeram o delito por motivo fútil  e com emprego de explosivo, conforme dispõe o art. 121, §2º , incisos I e II do Código Penal Brasileiro. Só para recapitular, um dos motivos alegados pelos torcedores para que o sinalizador fosse acendido e posteriormente disparado, foi justamente o gol corintiano, o único do time que selou o empate de 1 X  1 do Corintians com o San José, como forma de "calar" a torcida adversária, que estava comemorando muito o alto rendimento de seu time contra um campeão mundial, que em sua primeira partida da Libertadores, não estava jogando grande coisa. O disparo do pequeno rojão que, como um foguete, acertou em cheio o jovem torcedor boliviano, tinha destino certo: a torcida adversária. O sinalizador não  foi disparo para o alto e nem para o campo, como em outros tristes episódios, jogadores chegavam a ser alvejados por tais objetos. É, de fato, uma conduta criminosa.

Infelizmente, a violência, estupidez e conduta criminosa não pode ser aplicada apenas aos torcedores corintianos, mas sim a todas as torcidas organizadas do país. Sexta-feira passada, torcedores do Força Jovem do Vasco foram presos após o cumprimento de mandados judicais relativos à investigação sobre a morte de um torcedor flamenguista, em abril do ano passado. Tirar a vida de alguém motivado por uma competição esportiva é um dos motivos mais fúteis que existe, e revela não só a personalidade, mas também a periculosidade dos autores do crime.É lamentável saber que em nossos estádios podemos estar convivendo com assassinos em potencial, que a qualquer sinal de frustração ou comprometimento de seu time, são capazes de cometer atos bárbaros, como o que vitimou o jovem Kevin Espada.

Espero, piamente, que os jovens que cometeram este triste ato, matando um adolescente em solo estrangeiro, sejam devidamente punidos pela lei boliviana. Não posso concordar com qualquer tipo de postura irresponsável adotada por torcidas organizadas, especialmente por aquelas que acham que podem tudo, levando armas, petardos e explosivos para jogos, como se estivessem indo para uma guerra. Considero que tais atitudes são uma antítese do futebol e contrariam muito aquela visão romântica do esporte e da narrativa épica dos eventos futebolísticos, que fazia eu, quando criança, recolher fotografias de jogadores em tampinhas de refrigerante, tamanha era a reverência a esses "super-heróis" dos gramados. E voltando a pensar na minha infância, penso na juventude tristemente desperdiçada do menino Kevin, que como tantos outros jovens e adolescentes que vão aos estádios de futebol, querem apenas celebrar a alegria do futebol, comemorar as vitórias de seu time e deleitar-se com a visão de seus ídolos. É muito triste que tal fato tenha acontecido; mas que isso sirva de lição para que mais nenhuma torcida de time brasileiro cometa a mancada que foi praticada pelos torcedores corintianos. Somente assim, aquela criança feliz, colecionadora de tampinhas de outrora, poderá voltar a sorrir dentro do adulto que ainda se choca com tantas cenas de violência e morte, num esporte que deveria ser um espetáculo a celebrar a vida e a alegria. POR FAVOR, CORINTIANOS, NÃO ME LEVEM A MAL, MAS NÃO DEIXEM SEUS TORCEDORES DESTRUIR O FUTEBOL! MENOS VIOLÊNCIA E ESTUPIDEZ NOS ESTÁDIOS! Não é só a família enlutada do menino Kevin que pede isso, mas também todos os amantes do futebol de bom senso, que tem um mínimo de consciência para não praticar tais barbaridades. Portanto, pensem um pouco nisso!

Nenhum comentário:

Postar um comentário