sábado, 22 de fevereiro de 2014

CRIME: O chamado "Caso Izânia" é mais do que uma trama complexa, digna de romances policiais.

Descanse em paz, Izânia: mais uma jovem vida tristemente ceifada.
É muito duro ter de escrever sobre casos criminais trágicos, que envolvem como vítimas pessoas que você conhece. Sofri isso no ano passado, ao retratar aqui neste blog a violenta morte da advogada Vanessa de Medeiros. Vanessa foi minha aluna na faculdade, e saber de seu falecimento tão violento, espancada até a morte pelo ex-namorado em um motel foi algo extremamente triste, além de revoltante. Como se não bastasse, no começo deste ano, oriunda da mesma faculdade, a estudante de direito Izânia Bezerra também foi morta, desta vez em uma estrada carroçal, vitimada por tiros disparados contra seu pescoço e cabeça dentro do veículo de seu ex-marido, o tenente da PM Iranildo Félix, acusado de, na semana anterior, ter matado um lutador de MMA na frente da academia onde este trabalhava. Em comum com as duas mortes, os seguintes dados: ambas eram jovens e bonitas, na casa dos trinta e poucos anos; tiveram término de relacionamento amoroso com policiais militares, mas estavam na companhia deles quando foram mortas; eram estudantes ou formadas em direito, oriundas da mesma instituição de ensino.

É óbvio que para muitos as informações acima que comparam os dois crimes são mera e triste coincidência. Mas não é de coincidências que quero escrever sobre esse horrível crime neste blog. Na verdade quero chamar a atenção do leitor para outro fator: a violência contra a mulher. Não estou aqui falando da violência óbvia, bárbara, que matou essa duas jovens mulheres. Falo de uma violência simbólica, de gênero, como antecedente de toda a explosiva agressão que essas moças sofreram e que serviu de crônica anunciada de suas mortes. Será que elas poderiam ter outro destino?

Sem entrar aqui nas vicissitudes de um complexo caso, somente sei que Izânia, testemunha-chave de um inquérito de outro homicídio, onde seu ex-marido era suspeito, iria depor no dia seguinte ao de sua morte. No jogo de manipulações em que mulheres jovens, de origem humilde, acabam por se envolver, parece que a falecida estudante de direito viu-se manipulada por um jogo muito mais perigoso do que se pensava. Segundo a imprensa, em relatos de seus familiares, diz-se que ela mantinha um bom relacionamento com seu ex-companheiro, com quem tinha dois filhos; mas não ficou claro qual era o temperamento de seu ex-marido a ponto de forçar uma superação. O que se sabe é que ele se encontra afastado da Polícia Militar há mais de um ano por problemas de saúde (seria acometido de uma forte depressão), mas no dia da morte de Izânia, quando, segundo ele, dois homens de capacete em uma motocicleta, atiraram contra seu veículo, Iranildo, além de estar armado, usava um colete à prova de balas. Por que tanto cuidado assim ao sair de casa, a ponto de levar uma arma que lhe é proibido usar enquanto estiver de licença médica? E o emprego do colete? Será que ele já sabia que seria vítima de um atentado? E por que entrar numa estrada carroçcal, ao invés de dirigir em uma via principal? São tantas perguntas que devem estar fazendo os delegados destacados para o inquérito da morte da estudante, que as respostas não cabem sequer nesse espaço.

O que é curioso é que a motivação de todos esses delitos converge para o mesmo fator passional: ciúmes ou possessividade de ex-companheiros. No caso da morte do lutador Luiz de França Trindade, que antecedeu a de Izânia, mas que lhe é correlata, um dos motivos apontados para a tese da acusação contra o Tenente Iranildo é de que este estivesse enciumado de sua atual namorada, desconfiando de algum flerte desta com o lutador assassinado. Confirmando-se essa tese, teremos mais um caso de homens possessivos, que em nome de uma suposta honra aviltada ou orgulho ferido, são capazes de matar, enlouquecidos pela paixão. Se as paixões criam relacionamentos, elas também os destroem de forma trágica, principalmente numa região onde o patriarcalismo e o machismo predominam, pois ex-esposas ou companheiras passam a ser tratadas como propriedade e não como seres humanos.

Izânia e Vanessa morreram por motivos diferentes, mas ambas terminaram suas vidas nas mãos de seus ex-companheiros. Mais uma vez eu enfatizo um detalhe que já havia constatado na morte da advogada Vanessa: a condição de policial militar de ambos não serviu para protegê-las, quando, na verdade, pressupunha-se que esses agentes da lei fossem capazes de honrar o juramento que fizeram em suas corporações. Ao invés disso, se não mataram suas vítimas, as deixaram morrer, e isso deve ser profundamente triste também para os dois. Numa espiral de violência, parece que um ciclo de agressões gerou mais agressão, e na bola de neve que se tornou o caso da morte de Luiz de França, fatos macabros parecem corroborar a tese de que se trata de um caso bem difícil de elucidar.

Como professor de direito permito-me ceder espaço à ampla defesa e o contraditório, que venha o resultado das investigações e seja instaurada a ação penal cabível. Encontrando-se ou não os culpados, eu somente sei que uma eventual responsabilização do atual suspeito não trará Izânia de volta, para tristeza de seus familiares e colegas de classe. Que ao menos a justiça seja feita, então! Honremos a memória dessa pobre moça assassinada, encontrando seus algozes.


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