quinta-feira, 20 de novembro de 2014

MÉXICO: A violência do crime organizado mexicano ameaça derrubar o governo

Tem certas coisas que a gente pensa que acontecem somente em nosso país. Quando se fala da violência do narcotráfico no Brasil, na maioria das vezes pensamos que o horror do conflito entre policiais e traficantes nos morros cariocas, por exemplo, é um dos maiores do mundo. Esquecemos às vezes por mera ignorância  dos países vizinhos, ou que a medonha realidade criminal brasileira não é só do Brasil, mas da América Latina. Vide o México!

43 vidas assassinadas cruelmente,por motivos banais.
Recentemente descobriu-se que um ônibus, contendo 43 estudantes provenientes de uma escola na zona rural da província de Guerrero, que participavam do movimento estudantil mexicano, foi desviado da rota quando se aproximava da cidade de Iguala, local onde iam protestar contra o prefeito, José Luis Abarca, suspeito de ter ligações com o narcotráfico local. Após o desaparecimento dos jovens, descobriu-se semana passada que todos foram mortos, executados por integrantes do Guerreros Unidos, um dos centenas de cartéis de drogas que se espalha pelo México, após terem sido presos, levados a uma delegacia e entregues aos traficantes. Após o escândalo internacional do caso, o prefeito e sua mulher foram presos e a popularidade do atual presidente mexicano, Peña Nieto, despencou imediatamente de 67% para apenas 33% de aprovação popular, o pior registro de um mandatário no México nos últimos cinquenta anos.

Pelos detalhes do crime, investigados pela Procuradoria Geral da República, os jovens estudantes foram sequestrados e mortos com requintes de crueldade próximo a um lixão (muitos foram asfixiados, enquanto outros foram mortos a tiros) e seus corpos foram incinerados, para que o trabalho da Polícia fosse dificultado, na identificação dos corpos. Apesar disso, descobriu-se a trama macabra que resultou na morte dos estudantes e pode custar a cadeira da presidência do México. Ao saber que os estudantes estavam se aproximando da cidade em um ônibus, e que poderiam interromper um discurso da primeira-dama, Maria de Los Angeles Piñeda, o prefeito Abarca declarou a sentença de morte dos garotos, conforme mostraram as investigações, sendo capturadas conversas telefônicas em que o prefeito ordena aos policiais que abordaram o ônibus, que "se livrassem deles para sempre", tendo o prefeito recebido uma chamada telefônica horas após, com a confirmação dos algozes, de que os estudantes "tinham virado pó".

Nas ruas do México,a revolta de familiares dos estudantes.
A violência criminal do narcotráfico mexicano é uma das piores do mundo, com o histórico de crueldade de seus integrantes, com execuções sumárias e cenas de decapitações vistas à exaustão. Mas o que assusta mais na política criminal mexicana é o comprometimento de alguns setores da Polícia, do empresariado e do próprio governo com os narcotraficantes, em casos flagrantes de corrupção e clientelismo. Tudo leva a crer que Aranda, um megaempresário do ramo da mineração, chegou à política através do apoio de chefões locais do tráfico de drogas, após a desativação dos antigos cartéis da região e a formação de um novo cartel, agora liderado pelo Guerreros Unidos. Em um país onde o IDH é comprometido pelos desvios de recursos públicos e um presidente com pose de galã de novela, mas zero de iniciativa, é preocupante ver o quanto a situação mexicana pode servir de (mau) exemplo para as políticas de repressão penal pensadas em outros países, como o Brasil.

O ex-prefeito de Iguala e sua mulher:presos após a revelação das mortes.
Ao menos um ponto em comum existe entre o caso mexicano e o brasileiro: a corrupção. Assim como no Brasil, no México os lucros exorbitantes produzidos pelo narcotráfico geram dinheiro suficiente para subornar, muitas vezes com sucesso, vários agentes públicos. É um esquema piramidal de corrupção que pode atingir desde policiais a magistrados. Porém, sua faceta  mais medonha encontra-se na classe política, representada por indivíduos demagogos, que diante dos meios de comunicação bradam a plenos pulmões seu compromisso com a "Guerra às Drogas", mas nos bastidores tem o apoio financeiro e político de megatraficantes. Através de uma bancada vinculada aos seus interesses no Parlamento, os grandes traficantes de drogas permanecem ocultos e impunes a frente de uma indústria poderosa, que custa anualmente milhares de vidas, principalmente daquelas relacionadas com a criminalidade violenta associada ao tráfico, tal como a execução dos infelizes estudantes de Guerrero.

Ao menos diante de uma tragédia de tamanha magnitude, o que pode se tirar de lição desse horrível episódio é que a morte dos estudantes serviu para mobilizar a população mexicana e a fortalecer seus movimentos sociais, que impulsionaram fortes protestos que culminaram com a pichação das paredes da residência presidencial. Se a cruzada antitráfico desenvolvida no mandato do presidente anterior, Felipe Calderón, não rendeu sucesso, parece que ao menos o ímpeto do movimento estudantil e a morte de seus 43 representantes, hoje considerados mártires, não cedeu um milímetro. Que ao menos a  sociedade mexicana possa se mobilizar para a efetiva mudança, antes que seja tarde. Afinal, seus jovens filhos mortos merecem ao menos uma revolução social, como justa homenagem.

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