domingo, 8 de agosto de 2010

MANUAL DO ADVOGADO CRIMINALISTA: PARTE I

Se eu fosse tratar a tituto de apresentação, diria que a iniciativa deste blog já foi mais do que externada para aqueles que se deram o tempo de ler minhas porcas e tortas linhas. De qualquer forma, abro uma nova perspectiva de encarar o fenômeno criminal agora bancando o Lair Ribeiro da criminalística. O guru da autoajuda de muitos jovens advogados que querem lidar com um dos setores mais nobres e mais tradicionais da ciência jurídica que é o Direito Penal. Mas antes de lidar com o processo penal, precisamos lidar com pessoas, lidar com a sociedade, encarar fatos e situações que envolvem crimes e criminosos. Desta forma, nesse singelo manual que agora trago ao conhecimento do público, vão aqui algumas dicas, sugestões e contribuições de quem já advogou, pretende voltar a advogar e gosta de lecionar sobre como advogar nessa pitoresca seara que é a área criminal.

IDENTIFICANDO O CENÁRIO:

Um bom advogado crimminalista trata de identificar a realidade com a qual vai trabalhar. Analisa o comportamento de juízes, promotores, outros advogados da área, além de traçar um perfil de vítimas e criminosos. Toma conhecimento do funcionamento dos cartórios, passa a conhecer os funcionários e estabelecer contatos pessoais por meio de um agendamento de telefones e e-mails. É fundamental que ele saiba, por exemplo, qual é a maior frequência de lides penais na comarca em que vai atuar e quais são as decisões majoritárias tomadas pelos tribunais locais, em nível de jurisprudência, acerca de temas penais específicos. O advogado criminalista tem seu próprio "fio de Ariadne" que o guia através do labirinto de processos e casos jurídico-criminais, sempre tendo debaixo do braço um exemplar do Diário Oficial, ou acessa pela internet os julgados criminais mais recentes, para não ser atacado pelo Minotauro do fracasso profissional.

DAS RELAÇÕES COM OS CLIENTES

Clientela é fundamental para qualquer profissional liberal, que o diga da advocacia e, naturalmente, está diretamente relacionada à condição sócio-econômica da população. Segundo o historiador John Gillissen, os advogados como se conhece hoje surgiram na Era Moderna no período de ascensão da burguesia, quando era necessário que causídicos defendessem os interesses da classe emergente de comerciantes contra a atrasada jurisdição feudal, e por isso, eram remunerados por tal tarefa. Apesar da expressão honorários estar até hoje relacionada com o caráter honorífico e a tarefa honrosa de se defender judicialmente alguém, no sistema capitalista os honorários passarram a significar não apenas a virtude do exercício de uma nobre profissão, mas sim um potencial fator de acumulaçáo de riqueza para os advogados. Na área criminal não deixaria de ser diferente, e os advogados criminalistas são os que mais lucram, dependendo do ãmbito de infrações penais que se debruçam a trabalhar. Alguns advogados se tornam habilidosíssimos defensores do tribunal do júri, enquanto que outros se dão melhor assessorando empresas, em funções de consultoria, proporcionando defesas em crimes econômicos ou ambientais. Ainda existem aqueles que advogam para o crime organizado, patrocinando causas de traficantes e chefes de quadrilhas, ou aqueles que se debruçam a defender funcionários públicos acusados de corrupção, em processos criminais ou procedimentos disciplinares administrativos. Na relação com o cliente o advogado criminal sempre tem que levar em conta o seguinte lema:" posso não gostar do sujeito, mas todo cidadão tem direito a uma boa defesa". É esse o slogan que o advogado criminalista iniciante deve transformar num verdadeiro mantra, mostrando porque é importante a advocacia, valorizando seu trabalho profissional, ao mesmo tempo em que auxilia no patrocínio da justiça.

DAS RELAÇÕES COM A POLÍCIA

Um bom advogado criminalista sempre mantém uma estreita relação com os órgãos da repressão estatal, especialmente com as polícias, seja ele militar ou civil. Há advogados que se relacionam melhor com policiais militares, pois, vira e mexe, conseguem estabelecer uma boa rede de contatos nos comandos ou nas corregedorias, advogando para policiais militares eventualmente presos, acusados de tortura, corrupção ou desvio disciplinar. Outros advogados aproximam-se mais da polícia civil, e por terem os delegados como seus colegas de formação, por serem bacharéis em direito, tendem a manter uma sólida rede de amizades e cooperações, no sentido de descobrir casos e advogar para suspeitos indiciados em inquéritos policiais. É fundamental que o advogado consiga se fazer respeitar nas delegacias sem que isso implique em intervenção nas tarefas dos delegados, e não podem eles tão e simplesmente funcionar como promotores, realizando um controle externo, querendo participar das açóes policiais e diligências. O advogado criminalista tem que saber que no teatro criminal ele desempenha um papel semelhante a de um jogador de xadrez, onde a polícia e o Estado figuram do lado adversário, querendo imputar uma conduta criminosa  a seu cliente, e ele, por outro lado, age com as peças dentro desse tabuleiro, também realizando sua tarefa investigativa, que podemos chamar de "contrainvestigação". Para dar somente um exemplo, vamos ao caso das interceptações telefônicas. É claro, lógico e translúcido, que um delegado de polícia jamais revelaria ao advogado de um suspeito investigado, que estaria monitorando com autorização judicial os telefones utilizados por seu cliente. Por outro lado, sabedor das ligações do cliente, o advogado participa do jogo, orientando seu cliente de como falar ao telefone, sugerindo que determinadas conversas só sejam feitas pessoalmente e em locais reservados, ou pelo uso da internet, atráves da utlização de caixas postais, por meio de correio eletrônico. Nas reconstituições, pela própria norma processual penal, o advogado sabe que seu cliente não é obrigado a produzir prova contra si próprio, e por isso recomenda, por vezes, que ele não participe da reprodução simulada do fato delituoso que se envolveu. Nos interrogatórios, devido à precariedade do caráter probatório do inquérito, o advogado crimnalista também sabe orientar devidamente seus clientes nos interrogatórios, sempre tomando o cuidado de obter acesso aos depoimentos alheios, úteis à investigação, para já na fase pré-processual ele possa desenvolver sua linha de defesa. Assim como a polícia trabalha com informantes, é bom que o advogado também possua os seus, que lhe façam permitir que seu cliente se antecipe aos passos da polícia, não dê motivo para investigações ou perseguições infundadas, e que mantenha sempre o máximo de discrição e reserva possíveis. O advogado criminalista consegue se antecipar ao inquérito quando consegue que seu cliente, já no momento da redação dos famigerados boletins individuais e de vida pregressa, apareça formalmente aos olhos da polícia como o mais pacato e inofensivo dos seres. É importante para isso orientar a vida social do cliente de modo que ele venha a trabalhar com álibis ou lhe seja possível dissipar suspeitas, dependendo dos lugares e atividades que o cliente realiza. O advogado criminalista, em síntese, funciona para o acusado como um escudo contra a intervenção da polícia.

DA RELAÇÃO COM OS JUÍZES E COM OS MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO
O advogado criminalista compõe com promotor e juiz uma tríade assimétrica e equidistante. Se de um lado os membros do ministério público representam a acusação no processo penal, o advogado simboliza a defesa, enquanto que o juiz mantém uma distância de ambos, posicionando-se acima, com uma formal neutralidade, que sabemos que só existe de maneira formal na literalidade da lei. Graças à contribuição da criminologia crítica, sabemos que o julgamento dos juízes são sempre valorativos e o sistema penal funciona mediante uma seletividade, onde necessariamente juízes e promotores escolhem aqueles que merecem, segundo sua lógica de classe, receber a punição penal. Advogados criminalsitas não são ingênuos de achar que a justiça é igualmente promovida a todos, e sabem que do mito positivista da igualdade formal de todos perante a lei, o que sobra é tão somente a aplicação da lei penal para os menos abonados economicamente. Nesse sentido, no jogo de cena do cenário criminal, é interessante que ele consiga transformar seu cliente, aos olhos do Judiciário e da acusação, no mais pobre, mas também no mais íntegro dos homens, trabalhando a ideia de que ali se encontra no processo mais uma vítima do sistema e não tão somente um pobre diabo que optou pelo crime.No processo penal, face a herança racionalista, ainda é conferido um grande peso e valorização da prova pericial, e, nesse sentido, é interessante ao advogado criminalista sempre trabalhar com novas perícias ou com o questionamento das perícias anteriormente realizadas, sempre trabalhando para produzir novos meios de prova, cientificamente apuráveis. A possibilidade da contratação de peritos extraoficiais, assim como a consulta a profissionais e técnicos de outras áreas do conhecimento, de relevante contribuição social ou de elevado status ou prestígio profissional, também serve como uma relevante ferramente para aqueles que querem exercer uma boa advocacia durante o processo criminal. É natural que a desclassificação delitiva ou a negativa de autoria são as duas linhas-mestre de qualquer boa e qualificada defesa criminal.

Em síntese, esses foram uns primeiros apontamentos daquilo que espero que sirva como um pitoresco retrato de como eu vislumbro a advocacia criminal e de como me proponho, como profissional da área, a trabalhar esses temas e debatê-los aqui com pessoas tão interessadas quanto eu. Não é necessário concordar ou discordar das teses apontadas acima, mas o diálogo e a contribuição através da crítica, estabelecendo algum comentário, sáo sempre bem vindos. Como disse antes, a proposta é construir conjuntamente ideias, mais do que informar, e no momento em que estes escritos produzirem ecos, creio que parte da missão já estará cumprida. Até a próxima parte!!

16 comentários:

  1. Muito bom!!!!! Foi praticamente uma AULA MAGNA de dicas e procedimentos dos quais os advogados devem se resguardar. Parabéns, estou ansioso pela II Parte.

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  2. Achei muito bom o tópico.
    Animaria de fazer um tópicos para aqueles iniciantes que querem abrir um escritório?
    (sugestão pra parte 2)

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  3. Agradeço os comentários e informo que em breve, sobrando um tempinho na minha agenda atribulada, pretendo redigir a parte II de nosso manual. Um grande abraço a todos!

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  4. Muito bom artigo. Ansioso espero o segundo tomo.
    Parabéns professor!
    Sergio Luis Almeida Lisboa

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  5. Olá, descobri por acaso este blog e gostei muito do texto. Ficou um gostinho de quero mais.
    Acho interessante tópicos sobre como realizar a defesa em audiências criminais, talvez especificamente para algumas áreas, como tráfico, roubo, etc...

    Abraços a todos...Sérgio Alessandro Pereira - advogado

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  6. legal, vou ganhar muito dinheiro soltando os vagabundos atraves das brechas da lei.

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  7. muitoo bom parabéns Fernando Silva Alves
    boom pretendo ser um advogado criminal também .

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  8. Muito interessante,estou no 2 período de Direito, e pretendo ser da área criminalística,tanto que já estou no curso de capacitação de Psicologia jurídica e Crimes hediondos,e iniciarei dia 26-10-2013 o curso de Direito Penal.Talvez alguém fale que é um pouco cedo mas a minha paixão e vocação diz que nãooooo.



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  9. Parabéns pelo artigo, grande advogado criminalista. Fico feliz em encontrar profissionais com boa formação humanista e com grandes conhecimentos nesta nobre área do Direito Criminal. O Brasil precisa de homens com esta visão e com esta sabedoria. Um grande abraço!

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  10. Parabéns pelo excelente texto provocante e esclarecedor. Estou começando na seara criminal (sou tributarista) por conta de um grande cliente, e precisava destas linhas mestras da carreira do advogado criminalista para me orientar. Obrigado.

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  11. Excelente artigo. Pena que foi curto e nos deixou com muita ansiedade de sua continuidade.

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  12. Amei! Cada dia mais apaixonada por essa área!

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  13. Boa tarde. Excelente Texto. Estou direcionando meu foco ao Tribunal do Juri, por favor, me de algum direcionamento, literaturas, cursos, sites etc... Todo começo é difícil. Mas com certeza, será algo magnifico a se alcançar. Grato. Fabricio Rios(45) 99982-8091 ( whats)

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  14. Gostei meu sonho ser uma advogada criminalista

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  15. Justo o que procurava sobre advogado criminalista, muitíssimo obrigada!

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